Refletindo sobre o mundo atual, nos deparamos com tantas incertezas, medos e dúvidas. A presença da pandemia, o aumento da violência, casos brutais e aterrorizantes, agora uma guerra predatória com força e agressividade desmedidas nos deixam atônitos e, por vezes, desolados.
Onde está Deus no meio desse turbilhão? Como podemos afirmar com tanta certeza que o governo do mundo está em suas mãos e como afirma Agostinho, Ele é o “Sumo bem” (identificando em Deus a figura do Summum bonum, da teoria aristotélica). Que caos é esse que Ele está nos permitindo viver, ou pior, está nos expondo?
Tais questionamentos nos permeiam todos os dias e é compreensível que nós possamos refletir sobre isso. Qual a relação real do ser humano dentro da Teodiceia (doutrina, grosso modo, que busca ler a trajetória imanente de Deus pela história, frente a natureza do mal e sua atividade)? Por que Deus gosta de “brincar” com a humanidade dessa forma? Onde está Deus no meio dessa maldade?
Me vi encantado quando tive contato com o pensamento do teólogo contemporâneo e pastor alemão Jürgen Moltmann (1926-presente), que foi, quando jovem, obrigado a servir o Exército Alemão durante a Segunda Guerra Mundial e se viu, como cristão e pensador, a responder a essa pergunta? Onde estava Deus durante o nazismo?
Frente o mal é normal nos fazermos essa pergunta e diante do regime nazista onde milhares de pessoas foram mortas apenas pela sua origem étnica, por suas opções e opiniões, por uma deficiência, em nome de uma ideologia que se achava superior simplesmente por sua cor de pele e por ter nascido geograficamente em uma região do mundo. Mortos friamente, das piores maneiras possíveis, sem doer, sem sentimento, roboticamente.
Moltmann na busca de trazer respostas a estes anseios desenvolve o que chamamos hoje de “Teologia da Esperança”. Deus não estava distante, em seu trono, sarcasticamente acompanhando tudo, mas sim estava dentro dos campos de concentração (onde dezenas de judeus relataram experiências sobrenaturais e de aproximação com a fé), Deus estava com as mães, esposas e filhos que choravam, estava abraçando os familiares e chorando em um velório a dor humana.
Os teólogos católicos Theodor Schneider (1911-1988) e Hans Kessler (1938-presente) afirmaram traz em seu livro “Manual de Dogmática – Vol. I:” uma visão que corrobora com esse pensamento. Eles rememoram um Deus que “despiu-se” da sua Glória. Mas como pode um deus despir-se de seu poder, de sua eternidade, de sua essência? Para eles, Deus despiu-se de sua “riqueza” e de seu “poder”, para encarnar-se como homem, na “miséria” e “fragilidade” humana.
Esse é o Deus da esperança! O Deus que conhece o mais profundo do ser humano. O Deus que se permitiu conhecer os efeitos da maldade e as dores que o pecado trouxe a humanidade (sem pecar). O Deus que chora com as viúvas, o Deus que ampara o órfão, o Deus que cuida do desvalido, o Deus que peleja as guerras dos oprimidos, o Deus que defende a causa do injustiçado, o Deus que se dói com a nossa dor. Esse é Jesus! O filho de Deus. O Deus cristão.
“E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, assentando-se, aproximaram-se dele os seus discípulos; E, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo: Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus; Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados; Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra; Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos; Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia; Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus; Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus; Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus; Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós.” (Mateus 5.1-12)
“Porque foi subindo como renovo perante ele, e como raiz de uma terra seca; não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum. Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados.” (Isaías 53.2-5)